Pedro Baptista ‘Pronoia’

Exposição de pintura de Pedro Baptista, entre 30 de Junho e 16 de Julho.


PRONOIA Texto de Francisca Carvalho

Human nature is hunted, and has fled into sanctuary.
G. K. Chesterton, “Tremendous Trifles”

Estas pinturas são sustos pintados à maneira antiga, retratos de seres habitantes de uma distopia, retratados como príncipes e famílias reais ou grupos de indigentes, anões disformes da era barroca em que a espiral dramática e dissoluta comandava a composição e tudo quanto era forma expressiva.

Era barroca transportada e deformada pela visão partida, flutuante, desafectada, absurda, lúdico-cubista de alguém que vive com os pés oblíquos ao século de hoje.

Quase se acabou a ditadura da espiral nestas pinturas, o que há são relações figura/fundo – um compêndio de relações (sempre afectivas, sempre sujas) – que se encarnam sem aviso na forma da família da nuvem preta que olha para que ninguém olhe para ela, olha, assegurando as garantias do seu próprio abandono; ou na figura vegetal aracnídeo carnívoro que se encaixa à força num fundo opaco.

Já se disse algumas vezes que a pintura trata de seres de luz – sombra, opacidade, transparência – micro partículas que balançam nos entre tantos do espaço. Isso que é tão antigo continua a praticar-se por ser matéria de perplexidade. À conta dos seres de luz criou-se a utopia do mundo dos espíritos serenos, acabados, infinitos, imóveis.

Nas pinturas de Pedro Baptista há seres despóticos e guardiões de uma nova ordem ameaçada e ameaçadora ao mesmo tempo, nova ordem protagonizada por culturas de detritos, fungos e subespécies inacabadas em vias de prosseguir a sua colonização.

Nas pinturas de Pedro Baptista há seres despóticos como poderia haver outra coisa, tanto quanto fosse forma o suficiente, ponto de chegada o bastante que testemunhasse aquilo de que trata a pintura de Pedro Baptista: a tarefa do Pintor, que é tarefa de um desarmado oferecendo-se de mergulho ao experimento esquizofrénico de aceder ao mundo pré e ao mesmo tempo ultra codificado. O Pintor, assaltado pelo espírito partido, desirmanado, o que faz, é inventar meios de esconjurar forças que cheguem à forma inteira. O ponto de chegada – esta e aquela configuração de um estado de coisas – surpreende o ponto de partida.

A partida faz-se de uma preguiça contemplativa captando seres de muito baixa frequência, a partida é um pequeno vazio, um pequeno tumulto claro mas indistinto. O entretanto é o processo de modelação do indistinto e de contínua captação da claridade clareza, o ponto de chegada é o que se conseguiu fazer parar.

Este é um processo sem caminho certo, cada gesto é um pequeníssimo terreno conquistado em que o chão ficou subitamente assente, nunca garantindo o sucesso do próximo passo. Esse é um caminho que se percorre recorrendo à força de uma firmeza cega – devoto destemido à beira da desistência – rumo à meta sempre mutante – está-se na Zona e é-se um Stalker.

Lisboa, 21 de Junho de 2011


Pedro Baptista nasceu em Lisboa em 1981, onde vive e trabalha. Frequentou a Licenciatura em Pintura da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, tendo vindo a desenvolver o seu trabalho nesta área.